Estátua de poseidon (deus do mar) |
A
mitologia grega encanta ainda hoje seus leitores. A indústria cinematográfica
explora bastante os seres criados pelos gregos. Atualmente ganhou destaque,
sobretudo, entre adolescentes e jovens várias séries de livros que se baseiam
na mitologia helênica. Neste texto vamos separar por fins didáticos a mitologia
da religião em si. Em outra postagem analisarei a questão do culto na religião
grega que é inseparável dos mitos.
Entre
os historiadores existem basicamente duas vertentes em relação aos mitos
gregos. Uns associam os mitos como inerente à religião grega e outros que
separam. Dentre os últimos temos Paul Veyne que afirma:
Afinal, a mitologia grega, cuja ligação
com a religião era das mais fracas, no fundo não foi outra coisa senão um
gênero literário muito popular, um vasto quadro de literatura, sobretudo oral,
se já for válido usar o termo literatura, anteriormente à distinção da
realidade e da ficção, quando se admite o elemento lendário tranquilamente (VEYNE, 1984, p.
27).
Neste texto
apesar da separação meramente didática acredita-se que o mito não é apenas um
gênero literário, mas um dos aspectos da religião em que eram levantados
templos para cultuar os deuses, orações e sacrifícios a essas divindades como
assevera o helenista Jean Pierre Vernant em seu livro Mito e religião na Grécia antiga e que a separação entre mito e
religião não passa de um preconceito anti-intelectualista em matéria religiosa
(VERNANT, 2009) mas este é tema para uma próxima postagem.
Os gregos acreditavam em seus mitos?
Parece estranho
acreditarmos que os gregos acreditavam em mitos que para muitos não passam de
fantasias desconexas da realidade. Para os gregos a o sentido de verdade é bem
diferente do nosso como demonstra Paul Veyne (1984, p.28 ) “Estes mundos lendários eram cruamente
verdadeiros, no sentido que não se duvidava deles, mas não se acreditava neles
como se acredita nas realidades que nos circundam”. E ainda “é impossível que um mito seja inteiramente
mítico. Os gregos puderam criticar as fábulas no detalhe, mas não negligenciá-las.
O único debate consistia em decidir se a mitologia era verídica apenas em parte
ou na sua totalidade”(VEYNE, 1984, p. 74). Isso quer dizer que o mito é
verdadeiro no sentido figurado, mas não histórico. Ele tem um alto ensinamento
filosófico (VEYNE, 1984). Os gregos buscavam o núcleo de verdade em seus mitos.
O que são os mitos?
Ao contrário que
muita gente pensa os mitos não são sinônimos de mentiras, falsidades, invenções
sem relação com a realidade, lendas imbecis. Eles são uma tentativa de explicar
a realidade, sobretudo, as origens das coisas. Desse modo, o mito é uma forma
de explicar o mundo, de atribuir sentido ao existente e assim tranquilizar o
ser humano. Trata-se de uma verdade intuída, cuja autoria se perde no tempo,
sendo, em geral, considerado como uma produção anônima e coletiva. Portanto, os
mitos não são fantasias, mas uma forma de explicação que busca dar sentido ao
espírito humano. A sua verdade não é histórica, mas alegórica. Ele ensina algo,
pois o homem mais do que um ser racional e político como definiu Aristóteles ou
um ser que produz como ensinou Marx e Engels é um ser simbólico.
Segundo o
filósofo Cassirer (1994, p.50):
O homem não pode fugir à sua
própria realização. Não pode senão adotar as condições de sua própria vida. Não
estando mais num universo meramente físico, o homem vive em universo simbólico.
A linguagem, o mito, a arte e a religião são partes desse universo. São
variados fios que tecem a rede simbólica, o emaranhado da experiência humana.
Todo progresso humano em pensamento e experiência é refinado por essa rede, e a
fortalece. O homem não pode mais confrontar-se com a realidade imediatamente;
não pode vê-la, por assim dizer, frente a frente. A realidade física parece
recuar em proporção ao avanço da atividade simbólica do homem.
A realidade é
muito maior que imaginamos e nós humanos como seres simbólicos precisamos de
mediações para atingir algum aspecto da realidade e os mitos cumprem esta
função.
A mitologia grega
Estátua de Zeus |
Podemos chamar
de mitologia grega o conjunto de lendas e narrativas sobre deuses, heróis,
ninfas, centauros. As explicações mitológicas têm, na maior parte das vezes, um
caráter fantástico. A Mitologia Grega originou-se da união das
mitologias dórica e micênica. Seu desenvolvimento ocorreu por volta de 700 a. C.
Os mitos eram
transmitidos oralmente nas casas através das amas-de-leite, contados pelos avós
em que as crianças assimilavam desde o berço, bem como, dos aedos (poetas) que
acompanhados de instrumentos musicais cantavam publicamente em banquetes,
festas oficiais, concursos ou jogos os feitos dos seres sobrenaturais (VERNANT,
2009). Somente depois passaram a ser escritos, como por exemplo, em Ilíada e
Odisseia do século VIII a.c em que a tradição atribui a Homero.
Pode-se dizer que na Grécia
Antiga a religião era politeísta, pois os gregos adoravam a vários deuses. Não
existem escrituras sagradas (como a Bíblia para os cristãos) a respeito da
Mitologia Grega. Interessante que os deuses possuíam sentimentos humanos, ou
seja, sentiam inveja, ciúmes, ódio, amor e paixão, bem como, a forma humana. Era
comum os deuses se apaixonarem por humanos e com eles terem filhos. Alguns
heróis eram filhos de deuses e humanos. Os deuses, diferentes de seus filhos,
eram imortais.
Para os
Gregos, os deuses eram descendentes da terra - Gaia - e do céu - Urano - e
tinham grandes semelhanças com os homens.
O Monte
Olimpo é o ponto mais alto de toda a Grécia com uma altitude de 2 917 m.
Na antiga Grécia foi considerado a casa dos deuses importantes. Segundo
reza a história a entrada para o Olimpo fazia-se através de um portão
feito de nuvens, isto talvez se possa atribuir ao fato de o cume da montanha,
devido à sua altitude, estar sempre coberto de nuvens.
Os deuses
do Olimpo são os deuses mais poderosos dos vários grupos de deuses. Os deuses
do Olimpo se dividem em várias classes. A classe superior é formada pelos
seguintes deuses:
- Zeus - governante dos demais deuses.
- Hera– deusa que protegia casamentos (irmã e esposa de Zeus).
- Apolo - deus da luz, poesia e da música.
- Atena- deusa da sabedoria.
- Afrodite- deusa do amor e da beleza.
- Ares- deus da guerra.
- Poseidon- deus do mar
- Hefesto- deus do fogo
- Ártemis- deusa da caça
- Héstia - deusa do coração e da chama sagrada
- Deméter- deusa da agricultura.
- Hermes - mensageiro dos deuses.
A classe
inferior dos deuses é formada por:
- Hades- deus do subterrâneo (irmão de Zeus)
- Dioniso - deus do vinho, em algumas regiões era tão importante quanto Zeus.
- Pã - deus das florestas.
As ninfas
eram consideradas as guardiãs da natureza e as musas, representavam as artes e
as ciências.
Os heróis
ou semideuses
Além dos deuses os heróis também eram cultuados na
religião grega. Alguns heróis eram filhos dos deuses com mortais. Como atesta
Jean Pierre Vernant (2009, p.48 ), “Os
personagens heroicos cujos os nomes sobreviveram e cujo culto era celebrado em
seus túmulos apresentam-se muito frequentemente como frutos desses encontros
amorosos entre divindades e humanos dos dois sexos”. As características dos
heróis é que viveram em tempos antigos já acabados em que os homens eram
diferentes daquilo que são hoje: eram mais fortes, maiores e belos. Além de
permanecer na memória dos gregos, pois eram cantados pelos aedos, mesmo sendo
homens, sob vários pontos de vistas eram mais próximos dos deuses que a
humanidade atual; na morte não desciam às trevas do Hades, pois iam para um
lugar especial, ou seja, as ilhas dos bem-aventurados, onde gozavam da
felicidade numa vida semelhante aos deuses. Fora que alguns eram “arrebatados”
antes da morte. A maioria dos heróis foram heroicizados devido alguma qualidade
que possuíam como força, beleza, canto. Os principais heróis ou semideuses
foram:
Animais e monstros mitológicas
Centauro
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Metade
homem, metade cavalo.
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Ciclopes
|
Criaturas
gigantes com um olho no meio da testa
|
Minotauro
|
Metade
touro, metade homem guardava o labirinto de Creta
|
Pégaso
|
Cavalo
alado
|
Dentre os diversos mitos vou descrever e comentar o
mito da caixa de Pandora . Vejamos:
A caixa
de Pandora
A caixa de Pandora é uma
expressão muito utilizada quando se quer fazer referência a algo que gera
curiosidade, mas que é melhor não ser revelado ou estudado, sob pena de se vir
a mostrar algo terrível, que possa fugir de controle. Esta expressão vem do
mito grego, que conta sobre a caixa que foi enviada com Pandora a Epimeteu.
Pandora foi enviada a Epimeteu, irmão de Prometeu, como um presente de Zeus. Prometeu, antes de ser condenado a ficar 30.000 anos acorrentado no Monte Cáucaso, tendo seu fígado comido pelo abutre Éton todos os dias,alertou o irmão quanto ao perigo de se aceitar presentes de Zeus.
Epimeteu, no entanto, ignorou a advertência do irmão e aceitou o presente do rei dos deuses, tomando Pandora como esposa. Pandora trouxe uma caixa (uma jarra ou ânfora, de acordo com diferentes traduções), enviada por Zeus em sua bagagem. Epimeteu acabou abrindo a caixa, e liberando os males que haveriam de afligir a humanidade dali em diante: a velhice, o trabalho, a doença, a loucura, a mentira e a paixão. No fundo da caixa, restou a Esperança (ou segundo algumas interpretações, a Crença irracional ou Credulidade). Com os males liberados da caixa, teve fim a idade de ouro da humanidade.
Interpretação
Pode-se perguntar quanto ao
sentido desta lenda: por que uma caixa, ou jarra, contendo todos os males da
humanidade conteria também a Esperança? Na Ilíada, Homero conta que, na mansão
de Zeus, haveria duas jarras, uma que guardaria os bens, outra os males. A
Teogonia de Hesíodo não as menciona, contentando-se em dizer que sem a mulher,
a vida do homem não é viável, e com ela, mais segura. Hesíodo descreve Pandora
como um "mal belo" (καλὸν κακὸν/kalòn kakòn).
O nome "Pandora" possui vários significados: panta dôra, a que possui todos os dons, ou pantôn dôra, a que é o dom de todos (dos deuses).
A razão da presença da Esperança com os males deve ser procurada através de uma tradução mais acurada do texto grego. A palavra em grego é ἐλπίς/elpís, que é definida como a espera de alguma coisa; pode ser traduzida como esperança, mas essa tradução seguramente é arbitrária. Uma tradução melhor poderia ser "antecipação", ou até o temor irracional. Graças ao fechamento por Pandora da jarra no momento certo, os homens sofreriam somente dos males, mas não o conhecimento antecipado deles, o que provavelmente seria pior.
Eles não viveriam o temor perpétuo dos males por vir, tornando suas vidas possíveis. Prometeu se felicita assim de ter livrado os homens da obsessão com a própria morte. Uma outra interpretação ainda sugere que este último mal é o de conhecer a hora de sua própria morte e a depressão que se seguiria por faltar a esperança.
Um outro símbolo está inserido neste mito. A jarra (pithos) nada mais é que uma simples ânfora: um vaso muito grande, que serve para guardar grãos. Este vaso só fica cheio através do esforço, do trabalho no campo, seu conteúdo então simboliza a condição humana. Por consequência, será a mulher que a abrirá e a servirá, para alimentar a família.
Uma aproximação deste mito pode ser feita com a Queda de Adão e Eva, relatada no livro do Gênesis. Em ambos os mitos é a mulher, previamente avisada (por Deus, na Bíblia, ou, aqui, por Prometeu e por Zeus), que comete um erro irremediável (comendo o fruto proibido, na Bíblia, ou, aqui, abrindo a caixa, ou jarra, de Pandora), condenando assim a humanidade a uma vida repleta de males e sofrimentos. Todavia, a versão bíblica pode ser interpretada como mais indulgente com a mulher, que é levada ao erro pela serpente, mas que divide a culpa com o homem.
A mentalidade politeísta vê Pandora como a que deu ao homem a possibilidade de se aperfeiçoar através das provas e da adversidade (o que os monoteístas chamam de males). Ela lhe dá assim a força de enfrentar estas provas com a Esperança. Na filosofia pagã, Pandora não é a fonte do mal; ela é a fonte da força, da dignidade e da beleza, portanto, sem adversidade o ser humano não poderia melhorar.
Por Professor Bruno Rafael
Referências
CASSIRER, Ernst. Ensaio sobre o homem: introdução a uma
filosofia da cultura humana. Trad. Tomas Rosa Bueno. São Paulo: Martins Fontes,
1994.
FERREIRA, Olavo Leonel. Visita à Grécia antiga. São Paulo: Moderna,
1997;
VERNANT, Jean-Pierre. Mito e religião na Grécia antiga. Trad.
Joana Angélica. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
VEYNE, Paul. Acreditavam os gregos em seus mitos?
Ensaio sobre a imaginação constituinte. São Paulo: Brasiliense, 1984.
Sites
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