Parece tão comum
afirmarmos ou numa superficial consulta pela internet decretar o 8 de março
como o dia internacional da mulher, no entanto, a escolha desta data é motivo
de controvérsia. Quero antecipadamente afirmar que o 8 de março não tem nada a
ver com uma suposta retaliação à mulheres numa fábrica têxtil em 1857 nos
Estados Unidos como é comum divulgar no Brasil.
Alguns até afirmam
que o bendito 8 de março rememorava a morte de Hipátia, matemática e filósofa
romano-egípcia falecida neste dia no ano de 415, isso é mera coincidência.
Propaga-se que a data lembrava um trágico episódio em 1911, Nova York, de um
incêndio criminoso de uma fábrica têxtil onde morreram 146 operárias. Na
verdade o incêndio da fábrica de blusas femininas Triangle Shirtwaist ocorreu em 25 de março de 1911, foi acidental e
não estava associado a qualquer greve. Neste fato morreram 123 mulheres e 23
homens por queimaduras, inalação de fumaça e desmoronamento. Esse fato serviu
de estímulo para a criação do sindicato internacional das mulheres
trabalhadoras que passou a lutar por melhores condições de trabalho das
operárias têxteis, contudo, não foi motivo da criação do dia internacional da
mulher. Possivelmente esse fato permaneceu no imaginário coletivo a tal ponto
de pessoas, imprensa e movimentos o elegerem equivocadamente como a referência
originária para o dia internacional da mulher.
Clara Zetkin propôs o dia
internacional da mulher
Clara Zetkin era
alemã, membro do partido comunista alemão e militava no movimento operário que
se dedicava à conscientização das mulheres. Segundo a socióloga Eva Blay:
Ao
participar do II Congresso Internacional de Mulheres Socialistas, em
Copenhagem, em 1910, Clara Zetkin propôs a criação de um Dia Internacional da
Mulher sem definir uma data precisa.. Contudo, vê-se erroneamente afirmado no
Brasil e em alguns países da América Latina que Clara teria proposto o 8 de
Março para lembrar operárias mortas num incêndio em Nova Iorque em 1857( BLAY,
2004).
E
mais greves
Ocorreu também a
chamada greve do “pão e rosas” no estado de Massachusetts em janeiro de 1912.
Na ocasião 20 mil mulheres pararam a cidade de Lawrence por quase dois meses e
meio. Em março de 1912 a greve teve fim com as reivindicações atendidas, mas
logo depois os direitos foram perdidos. Interessante
que o 8 de março consagrou-se na Rússia pré-revolucionária em 1917, protestos
que antecederam e abriram caminho para a tomada do poder pelos comunistas.
Com a Primeira Guerra Mundial
(1914-1918) eclodiram ainda mais protestos em todo o mundo. Mas foi em 8 de
março de 1917 (23 de fevereiro no calendário Juliano, adotado pela Rússia até
então), quando aproximadamente 90 mil operárias manifestaram-se contra o Czar
Nicolau II, as más condições de trabalho, a fome e a participação russa na
guerra - em um protesto conhecido como "Pão e Paz" - que a data
consagrou-se, embora tenha sido oficializada como Dia Internacional da Mulher,
apenas em 1921(CENTRO DE INFORMAÇÃO DA MULHER).
A cronologia para chegar ao dia internacional
da mulher
Vale
ressaltar que o 8 de março não foi um fato isolado, mas um conjunto de
manifestações das mulheres por melhores condições de trabalho e vida, bem como,
por direitos que lhes eram negados. Transcrevo a cronologia elaborada pela
historiadora Joelza Domingues que enfatiza as lutas femininas ao longo do tempo
até a declaração da ONU em 1975 como o 8 de março sendo o dia internacional da
mulher.
Tem-se, assim, a seguinte cronologia: 1908, 3 de
maio: a organização Mulheres Socialistas celebra o Dia da Mulher em Chicago,
Estados Unidos. 1909, 28 de fevereiro: as Mulheres Socialistas do Partido
Socialista dos Estados Unidos organizam, em Nova York, o Dia Nacional da
Mulher, em homenagem à greve das operárias têxteis de 1908. 1910: a II
Conferência Internacional de Mulheres Socialistas, ocorrida em Copenhague,
propõe a criação de um Dia Internacional da Mulher sem contudo, estipular uma
data específica. Durante o congresso defendeu-se a luta pela igualdade de
direitos e pelo sufrágio universal a todas a mulheres. 1911: primeira
celebração do Dia Internacional da Mulher Trabalhadora na Alemanha, Áustria,
Dinamarca e Suíça, posteriormente estendido a outros países. 1914: primeira
celebração oficial do Dia Internacional da Mulher na Alemanha, Suécia e Rússia
quando se levantou a bandeira pela paz, pouco meses antes de eclodir a Primeira
Guerra Mundial. 1917: no dia 08 de março (23 de fevereiro no calendário
Juliano), trabalhadoras de tecelagens de Petrogrado, na Rússia, entram em greve
e reivindicam a ajuda dos metalúrgicos. O movimento desdobra-se em um
levantamento popular contra a monarquia czarista e pelo fim da guerra sob o
lema “Paz, terra e pão”. A data entrou para a história como prenúncio da Revolução
Bolchevique e foi posteriormente escolhida como Dia Internacional da Mulher.
1922: a China celebra pela primeira vez o Dia Internacional da Mulher. 1936:
primeira celebração do Dia Internacional da Mulher na Espanha. 1975: a
Assembleia Geral da ONU declara o dia 8 de março como Dia Internacional da
Mulher 1977: a Assembleia Geral da ONU amplia o significado da data que passa a
ser Dia Internacional dos Direitos da Mulher e da Paz Internacional. Desde
então, vários países oficializaram este dia dentro de seus calendários
nacionais. 1994: os Estados Unidos reconhecem o Dia Internacional da Mulher
acatando a reivindicação de Beata Pozniak, uma atriz e ativista imigrante da
Polônia (DOMINGUES, 2015).
E no Brasil?
No Brasil, as
movimentações em prol dos direitos da mulher surgiram em meio aos grupos
anarquistas do início do século 20, que buscavam, assim como nos demais países,
melhores condições de trabalho e qualidade de vida. A luta feminina ganhou
força com o movimento das sufragistas, nas décadas de 1920 e 30, que
conseguiram o direito ao voto em 1932. A partir dos anos 1970 emergiram no país
organizações que passaram a incluir na pauta das discussões a igualdade entre
os sexos, a sexualidade e a saúde da mulher. Em 1982, o feminismo passou a
manter um diálogo importante com o Estado, com a criação do Conselho Estadual
da Condição Feminina em São Paulo, e em 1985, com o aparecimento da primeira
Delegacia Especializada da Mulher.
Concluindo
Como você
observou neste texto, o dia internacional da mulher nada tem a ver com
manifestações mercantilizadas tão comuns na atualidade. As mulheres lutaram
contra as condições degradantes no trabalho, sobretudo, quando as leis
trabalhistas eram fracas. Mulheres lutaram para ter direito a eleger e serem
eleitas. Que no dia internacional da mulher seja lembrando que é um dia de
vitória, mas também de luta pelo respeito e valorização da mulher que de frágil
nada tem.
Por professor Bruno Rafael.
Referências
http://www.ensinarhistoriajoelza.com.br/dia-da-mulher-mito-e-verdade.
As origens e a comemoração do Dia
Internacional das Mulheres.
Ana Isabel Álvarez Gonzalez, 208 págs., Ed. SOF/Expressão Popular.